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terça-feira, 26 de maio de 2009

10. MENSAGEM ENVIADA

A estação de pesquisa situada em Tyon era pequena, e funcionava há menos de quinze anos. O corpo de cientistas era pequeno: apenas 13 indivíduos polivalentes que tinham que cuidar da própria manutenção da base. Tyon era o único satélite a orbitar o imenso planeta gasoso Bradhamua, o maior do sistema estelar de Galyssar. Kamt-Rud era o líder informal da equipe, e dirigia um pequeno veículo automotivo de multitração pelas areias escuras da lua gelada. O projeto de colonização de Tyon pelos aldhoritas - a única espécie inteligente a habitar o sistema da estrela amarela Galyssar - estava prestes a completar seu primeiro centenário, mas o clima daquele mundo ainda era inóspito demais para abrigar uma população de colonos.
Kamt-Rud era o responsável por supervisionar o cultivo de fungos criófilos na Zona 17, onde o suprimento de água do caudaloso Rio Ibemis-Koa-Leam garantia as melhores condições climáticas da faixa tropical-sul. Os fungos trazidos de Aldhor tingiam os canais artificais de um violeta muito forte, mas não prejudicavam a potabilidade, e ainda garantiam a umidade necessária para manter a população de vegetais introduzidos em crescimento. O aldhorita arregalou os olhos vítreos, como se tentassem identificar um brilho enigmático no horizonte. Daya-Kebn, sua companheira, gritou pelo comunicador uma mensagem que foi totalmente obliterada por uma forte estática. Antes que ele pudesse pedir para que ela repetisse a frase, um trovão ensurdecedor ecoou pelos vales de cascalho negro de Tyon. A onda de choque que se seguiu derrubou o veículo e fez com que as membranas auditivas do aldhoritas se rompessem.
Antes que ele se desse conta do que estava acontecendo, um feixe de raios mortais calcinou tudo a sua volta.
Daya-Kebn assistiu à morte do marido pela tela dos sensores do quadrante leste, sentiu seus órgãos palpitarem com uma profunda sensação de mal-estar. A estação estava sofrendo um ataque súbito, e as pequenas mas mortíferas espaçonaves foram identificadas como naves de guerra humanas da classe Mono. Daya-Kebn ainda tentou em vão contatar a Central de Colônias em Aldhor, antes que um pulso eletromagnético desligasse todos os equipamentos, deixando-os à mercê do frio de 27 graus negativos da superfície de Tyon. Dois outros cientistas cairam mortos à sua frente: Jin-Kla, com úlceras horríveis espalhando-se pelo rosto, e Kat-Tomas, gritando de dor enquanto balançava o braço mutilado. Um forte brilho amarelado envolveu o prédio inteiro, e parecia que alguma espécie de campo energético varria o terreno com efeitos desintegradores. Pensando apenas em seu marido e amigos mortos, Daya-Kebn não sentiu dor alguma quando um turbilhão de partículas ionizadas dissolveu seu corpo.
O ataque era apenas um alerta do Mercado Pan-Solar aos governantes aldhoritas.
Mesmo após a destruição das bases em Tyon, nenhum mensagem havia sido enviada pelos humanos.
Os conselheiros aldhoritas mais experientes já sabiam que explicações não eram necessárias.
A destruição era a própria mensagem.
Deveriam fazer o que os Humanos queriam: entregar os dissidentes e extirpar qualquer forma de rebeldia.

ÍNDICE GERAL DO BLOG

CONTOS
1. DEMÔNIOS DO ESPAÇO
2. ENTRE A CRUZ E A ESPADA
3. O FIM DA TRANQUILIDADE
4. DANDO NOME ÀS CRIATURAS
5. FUMAÇA COLORIDA
6. QUASE HUMANO
7. AS AMANTES DE AJAX BALTIMOR
8. QUASE VÉSPERA DE NATAL
9. TEMPO DE ESPERA
10. MENSAGEM ENVIADA


FICHAS
1. N'UMYANOS
2. ALDHORITAS
3.

Atualizado em 25-05-2009

terça-feira, 6 de maio de 2008

9. TEMPO DE ESPERA

As luzes de sinalização no Hangar 18 do Cruzador Espacial Tokyo estavam pulsando com o brilho verde característico da sinalização de decolagem de uma das mononaves estacionadas.
Deflesh Ramos passou um pente no topete gomalinado, e ajeitou os cabelos louros-avermelhados com cuidado. O andar preguiçoso realçava ainda mais seus 2,10 m de altura, e ele soltou uma série de palavrões quando ouviu pelo fone que o reparo no campo de força da Tokyo já estava finalizado, mas que as decolagens ainda deveriam esperar uma autorização posterior.
O tempo de espera até que não chegava a ser incomum, mas Deflesh mostrava sintomas de uma impaciência exagerada. Como todo aqueles da Raça BOLD, este soldado, nascido na colônia terrana de Donar, era condicionado desde a mais tenra idade a ser ilimitadamente violento e caninamente obediente a seus superiores. Para evitar quaisquer problemas colaterais, todos os membros da casta guerreira eram obrigados ao uso permanente de drogas tranqüilizantes nos momentos em que não estavam lutando.
O militar donarense só pensava em retornar para sua mononave, a Silent Locust. Uma vez embarcado, o tédio iria embora, e ele estaria a caminho do distante sistema estelar de Galyssar. Lá, orbitando um dos satélites do Planeta Therasia, estava posicionado o enorme Couraçado Peace, prestes a partir em missão preventiva para o Planeta Aldhor. Rebeldes aldhoritas estavam agindo em planetas da Esfera Neutra, fomentando dissidências e ameaçando a paz do Mercado Pan-Solar.
A distância entre Thoth, o planeta colonial que a nave Tokyo orbitava neste momento, e o distante Aldhor era de incríveis 1.550 anos-luz, mas graças ao portal de Pathmos, a viagem não demoraria mais que alguns segundos. Pathmos era um dos raros Objetos Espaciais de Wermund que haviam sido descobertos na Via Láctea. Até o presente momento, nenhum cosmólogo, terrestre ou extraterrestre, havia conseguido explicar o funcionamento e a natureza de tais passagens interdimensionais.
Por um simples acaso histórico, os humanos foram os primeiros a descobrir e catalogar esta rara espécie de objeto cósmico, no ano de 2078, quando a nave exploradora George Gamow II detectou perturbações gravitacionais a menos de um ano-luz do Sistema Solar, concentradas numa espécie de bolha energética de natureza desconhecida. Com o tempo, a exploração da Nuvem de Wermund (assim chamada em homenagem ao grande cosmonauta e astrofísico do século XXI Wermund Christiansen) por sondas microbóticas levou à descoberta que aquela nebulosa de energia “estranha” não somente servia como uma passagem hiperespacial segura para o Sistema Solar de Atna, mas também podia servir como uma poderosíssima fonte de energia. Este primeiro portal dimensional foi batizado de “Drop” pelo mesmo Wermund, porque ele percebeu que a Nuvem emanava “pingos” de hiper-energia. Após a morte de Wermund, muitas outras Nuvens foram descobertas pelas naves terrestres, e receberam nomes sugestivos como Warp, Alice, Bermudas, Pathmos e Avalon.
Deflesh começou a ranger os dentes, cada vez mais impaciente com a demora. Quando dois funcionários do hangar vieram comunicar o prazo para a decolagem, o soldado não suportou conter a raiva e descarregou nos pobres coitados. Um empurrão atirou o mais alto da dupla, de nome Mork, no chão lustroso do corredor, enquanto o seu companheiro, de nome Zingar, foi lançado contra um robô-limpante, derrubando-o com um grande estrondo metálico. O tumulto atraiu a atenção de outros tripulantes. Alguns outros soldados, já cansados da rotina, viram nisso uma oportunidade de diversão, e começaram a gritar, e incentivar a briga. Os empregados civis da nave, todos eles colonos, tentaram impedir o confronto contatando seus superiores. Sabiam que ninguém seria capaz um BOLD com raiva.
A Sargento Norge Nuyt, adentrou o hall com pressa. Ela era alta, com cabelos negros e olhos verdes claríssimos. As mulheres eram preferidas para a dita função devido à sua grande dedicação, e recebiam um treinamento rigoroso para aprender a lidar com as explosões de testosterona dos soldados. Elas preferiam ser chamadas de Viragos ou Amazonas, e não gostavam de nenhuma falha na rigorosa disciplina que imperava nas hostes militares terranas.
Assim que percebeu o que estava acontecendo, ativou o “freio sonoro” e mirou na cabeça de Deflesh. Um disparo certeiro fez com que o homem ficasse mudo. O aparelho conhecido como “freio sonoro” ou “rédea mental” dispara uma bateria de pulsos infra-sônicos que catalisam uma série de reações bioquímicas no cérebro, provocando uma paralisia quase imediata, e terminando num torpor absoluto. O coquetel de drogas que todo BOLD ingeria constantemente consistia num complexo sistema de conexões químicas que poderiam ser rapidamente ativadas ou desligadas por determinadas freqüências sonoras. Norge carregava uma minúscula plaqueta em seu antebraço, acionável quando pressionada.
Os outros soldados, que haviam se aproximado e acompanhavam empolgados a confusão, dispersaram-se rapidamente assim que viram a amazona chegando.
Norge calcou o corpo inerte de Deflesh com a bota, enquanto inteirava-se do acontecido. Com um ar de desprezo, ordenou que os soldados mais próximos ajudassem a carregá-lo até a enfermaria mais próxima.
— O vôo da Silent Locust está cancelado! — gritou ela para os controladores de tráfego interno do Cruzador.
Não era a primeira vez que Deflesh Ramos perdia o controle. Norge iria enviá-lo para um check-up completo. Desconfiava que o organismo do soldado estava começando a rejeitar os entorpecentes mentais, sofrendo algum problema de saturação.
Norge sentiu que não podia ficar esperando por ordens superiores. Seu lema de vida era sempre agir antes que os problemas ocorressem.
Prevenir, e não remediar.

TEMPO DE ESPERA
Texto: João Simões

segunda-feira, 14 de abril de 2008

8. QUASE VÉSPERA DE NATAL

Era a noite antes do Natal, e no Espaço não se via nenhum VOID malvado.
As meias foram penduradas com cuidado junto à janela,
pois Santa Klaws logo chegaria.
Eu fiquei na minha cama, sonhando com guloseimas e presentes.
Quando ouvi um barulho, corri direto para a janela, então eu pude ver.
Rápido como um raio, reluzindo com o brilho vermelho das renas, vinha o trenó de Klaws. Um rastro de neve branca e brilhante formava-se no ar.
As renas vasculhavam o céu com seus narizes disparando raios laser, à busca de possíveis inimigos, e suas galhadas tinhas pontas afiadas como diamante. Qualquer monstro de outro planeta que aparecesse, seria cortado em fatias e pulverizado.
Um barulho no teto, e eu voltei direto para minha cama.
Pela janela, Santa Klaws entrou com um salto. Seu casaco era fofo e vermelho, invulnerável. Ele balançou seus braços fortes, e eu pude ver aquelas garras afiadas, com as quais ele nos protegia dos malvados e imundos extraterrestres.
Fingi que estava dormindo, mas ele olhou para mim e deu uma piscada.
“Você foi um bom menino?” — disse ele, com sua voz trovejante.
“Se não foi...” — o medo quase congelou minha alma.
Ele soltou uma gargalhada, e após encher minhas meias com presentes, deu uma pirueta, e saltou pela janela.
Não tive coragem de abrir mais os olhos, mas continuei ouvindo o barulho das renas, e aquelas sonoras gargalhadas do Bom Velhinho Matador de Aliens.
À medida que eu caía no sono, ouvi uma música trazida pelo vento gelado:
“Um Feliz Natal para todos!”
Assim que Brasil Kosma terminou de contar a mesma história que era contada geração após geração em sua família, desligou a holotela e olhou satisfeito para seus filhos, Brasil Júnior, Kola e Tevãu, que ouviram a tudo muito interessados.
— Onde Santa Klaws mora, papai? — perguntou Kola, a filha caçula.
Brasil sentiu-se orgulho com o interessa da menina, e pôs-se a repetir mecanicamente o que costumava ouvir de seu finado pai, Tóvãu Kosma:
— Ele mora no Norte Branco, onde a neve cobre as florestas durante o ano inteiro. Lá os pinheiros brilham como árvores de natal, e os VOIDs convertidos trabalham nas fábricas de brinquedos e de doces para pagar pelos seus crimes.
Os olhos das crianças pareciam brilhar a cada palavra. Faltavam apenas dois dias para a tão esperada véspera de Natal, e a excitação das crianças ficava cada vez maior. Brasil beijou um por um, e levou-os até a cama larga de madeira onde todos dormiam juntos. Ligou os ventiladores, apagou a luz e foi sozinho para a varanda de sua humilde casa.
Brasil lançou um olhar perdido no horizonte. No céu escuro as estrelas brilhavam como jóias, e tudo indicava mais um dia seguinte sem chuva. O homem de pele morena e cabelos vermelhos era descendente dos primeiro colonos que chegaram em 2070 ao Planeta Thoth, uma das mais antigas colônias terrestres, cujo clima quente e árido era por demais hostil. No entanto naquela época distante em que os mundos disponíveis para a colonização eram bem poucos, os humanos não podiam se dar ao luxo de desprezar condições climáticas adversas. Conseguir colonos para tais planetas inóspitos era sempre difícil, mas iludidos por promessas de casa própria e colheitas abundantes, milhares de terráqueos afluíram às naves colonizadoras. Entre estes desesperados estavam os longínquos ancestrais de Brasil Kosmas.
A vida da família Kosmas era árdua, e mesmo com a toda a tecnologia de Terraformação funcionando a plena carga, os custos ainda eram altos para a população thothiana. As cidades maiores e mais antigas cresceram nas poucas regiões mais férteis das altas latitudes, onde concentraram-se os mais ricos do planeta. A grande maioria da população tinha que se contentar com condições de pobreza e miséria nos rincões mais inóspitos, onde trabalhavam na mineração e no plantio de vegetais nativos. A mineração, como em todos os planetas humanos, era feita por autômatos, mas uma série de conflitos e revoltas que estouraram no século passado levou à restauração da mão-de-obra humana, como uma forma de absorver a legião de migrantes e refugiados.
Brasil cuidava de uma pequena horta onde plantava tubérculos-prateados, inhames-thothianos e espinafre-gigante. O transporte ficava por conta de seu único camelo, Sinho, velho mais ainda robusto. Brasil tivera que gastar muito para conseguir os brinquedos de seus filhos. Não ganhar presentes durante o Natal poderia representar um trauma profundo para a mente infantil, e o agricultor sabia disso. Viúvo e pai de cinco filhos, a economia da família era complementada pelos rendimentos enviados pela filha mais velha, Lorá, mandada no anterior pelo pai para Neopolis, onde se matriculou na filial thothiana da Top Model High School, a venerada TMHS.
Há meses que Brasil não tinha mais notícias de sua querida Lorá, mas ela continuava mandando-lhe mensalmente uma modesta quantia em dinheiro. Devia vir do trabalho como modelo iniciante; com sorte — pensava o horticultor — ela seria selecionada para integrar a invejada Raça das MOD, mulheres novas e lindas cujo padrão de beleza era algo tão perfeito, que não podia ser atingido sem uma série de operações plásticas e a ação permanente de substâncias eugenomórficas. Tudo isso era muito caro, mas uma vez conseguindo seu objetivo, Lorá Kosma poderia melhorar em muito a vida de sua família. Com sorte, quem sabe até a pequena Kola poderia também ser mandada para a TMHS.
O lavrador vasculhou a mesinha da varanda à procura de um copo, e despejou todo o conteúdo de uma garrafa de águaprata, um forte aguardente feito com o sumo fermentado dos tubérculos-prateados. Não pôde deixar de perceber que as luzes na casa de seus vizinhos ainda estavam acesas. Cuspiu no chão, maldizendo a invejosa família dos Lacroix, que moravam a uns trezentos metros de distância. Ele tinha certeza que era Madlena Lacroix quem estava inventando as fofocas sobre sua filha: de que ela já havia sido expulsa da TMHS e que provavelmente acabara em algum Lupanar. Lupanar era o nome dado aos prostíbulos “ao vivo”. Numa época em que a ciberpornografia era uma das atividades mais lucrativas, a procura maior era por sexo virtual com criaturas 3D que se tornavam autênticas celebridades, as “BRAND”. A busca pela “Carne Humana”, como era chamada pejorativamente a prostituição de pessoas “reais”, era vista como uma perversão para uma minoria de degenerados e fracassados. Pagava-se pouco e as condições eram repugnantes.
Brasil Kosmas atribuía as mentiras de Madlena à inveja que sentia por sua filha Kilia ter sido derrotada por Lorá durante o concurso que a THMS organizou no ano passado. Ele sabia que sua filha nasceu para brilhar e vencer, e que estava destinada ao sucesso.
Seus filhos já deviam estar dormindo, e o pai orgulhoso voltou ao seu quarto para conferir os ganhos da noite passada com a Feira Agrícola. Ainda faltava dinheiro para comprar o presente de Tevãu, e isto estava tirando-lhe o sono. Brasil não acreditava mais em Santa Klaws, e intimamente sentia um ódio secreto pelo “Bom Velhinho Matador de Aliens”. Seu desejo era contar a verdade a seus filhos, mas sabia que não teria coragem para enfrentar a desilusão deles.
Faltavam dois dias para a véspera de Natal.

QUASE VÉSPERA DE NATAL
Texto: Simoes Lopes

sexta-feira, 11 de abril de 2008

FICHA ALIENÍGENA 2: ALDHORITAS

ALDHORITAS

DADOS ASTRONÔMICOS

Estrela

Galyssar

Tipo

G2 V (anã amarela)

Sistema

7 planetas, 79 satélites

DADOS GEONÔMICOS

Planeta

Aldhor

Tipo

TG 0,993

Atmosfera

Oxidante 2,7

Diâmetro

10 136 km

Gravidade

0,82 gravum

Ano

422 dias

Dia

20 horas

Hidrosfera

78 % água

DADOS BIONÔMICOS

Taxonomia

3125 Cynentomon xanthomma

Pés

2

Mãos

2

Dedos

2/4

Esqueleto

Exoesqueleto

Olhos

4

Bioquímica

Hidro-carbônica

Sangue

azul-cobalto


Possuem uns três metros de altura, seus corpos são cobertos por uma espécie de carapaça quitinosa azul-metálico. Quatro olhos multifacetados de cor amarela se assentam sobre um crânio parecido com o de um cão. Possuem quatro dedos nos braços, mas apenas dois nos pés. Sua carapaça dorsal é formada por nódulos arredondados.

terça-feira, 1 de abril de 2008

7. AS AMANTES DE AJAX BALTIMOR

As ondas de choque indicavam que Ajax Baltimor estava rompendo a barreira do som. O estrondo não o impediu de acelerar ainda mais, tornando o vento que fustigava seus cabelos um verdadeiro tufão. Assim que avistou o sítio onde morava, nas cercanias da Cidade Gamma III, reduziu a velocidade para garantir um pouso seguro. O sol brilhava forte, e ele acenou para as lindas mulheres que aguardavam por ele na piscina, nuas e exuberantes. Livrando-se rapidamente de suas roupas, ele flexionou suas musculosas pernas e mergulhou como um verdadeiro atleta. Melynda, uma loira de enormes seios e lábios cheios esperava por ele junto a Saskah, uma bubastisiana de cabelos azuis e pele escura. Ele puxou-as para junto de si com um único movimento, e uma delas lambendo sua tatuagem de carpas douradas no bíceps esquerdo. Suas outras amantes, Glessia, Ysha e Rind, vieram juntar-se ao grupo e...

Ajax pensou que seus tímpanos iam estourar quando o zumbido metálico do alarme reverberou dentro da sua cabeça. Fechou os olhos enquanto esperava passar a dor incômoda nos ouvidos.

Quando abriu os olhos mais uma vez, ele sabia que não podia mais ser Ajax Baltimor, mas sim 167009, um cosmotecnólogo do Setor 18 do Departamento de Fotocomputrônica Astronáutica. Não tinha mais músculos, não era capaz de voar e... o mais importante... não tinha mais um harém de amantes ninfomaníacas.

A manutenção da avançada tecnologia terráquea estava a cargo da Raça conhecida como NERD. Dedicados integralmente às tarefas que definiam suas vidas, esta classe estava tão “imersa” no mundo da Ciência e Tecnologia que não podia levar uma vida normal. Eram como abelhas operárias presas em um mundo à parte. Tudo aquilo do qual eram privados era compensado pelas fantasias vividas no universo virtual chamado NERDLAND, onde 167009 podia ser quem ele quisesse, sem limites ou censuras. O princípio dos Paraísos Ciberespaciais baseava-se em tecnologias já bem antigas, remontando à rudimentar tecnologia virtual de quase trezentos anos atrás, cuja popularidade oscilava em ciclos que alternavam altos e baixos. A partir do início do Século XXIII seu uso como uma espécie de droga escapista tornou-se mais uma vez tão disseminado que não havia mais nenhum NERD fora deles. A sua vida “física” era tão desinteressante do ponto de vista afetivo que nada podia competir com os delírios hedonistas de NERDLAND.

O cosmotecnólogo 167009 — todos os de sua categoria eram conhecidos apenas por números — desconectou-se hesitantemente de suas pontes ciberespaciais para retornar ao trabalho. Os Computadores Deltafotônicos que controlavam o sistema de holoblindagem do Cruzador Espacial Tokyo trabalhavam ininterruptamente e qualquer falha por menor que fosse deveria ser imediatamente corrigida. Um sistema complexo de controle automatizado garantia que a maior parte dos problemas fosse corrigida com rapidez, mas nos raros momentos em que não bastava, era necessária a ação rápida dos cosmotecnólogos. Assim que chegou, 167009 sondou com sua colega 187721 a configuração do sistema e puseram-se juntos a analisar o relatório de erros.

Nada grave.

Apesar do trabalho estafante, os NERD devotavam uma dedicação sacerdotal às suas tarefas cotidianas. Falar de fótons, pósitrons ou quarks era como um alimento revigorante para suas mentes hiperativas. Em poucos minutos, o sistema fototrônico estava corrigido e funcionando em carga máxima, graças aos esforços combinados dos dois companheiros. A cosmotecnóloga 187721 era a melhor amiga de 167009, e este até desconfiava que os sentimentos dela por ele ultrapassavam a simples amizade. Mas nenhuma garota NERD podia competir com as mulheres virtuais de NERDLAND, e a jovem cientista atarracada de cabelos vermelhos com certeza sabia disso, até porque ela também era uma assídua freqüentadora da Outro Mundo, como também era conhecido o Ciberespaço. Fosse qual fosse sua fantasia, ela também não deveria achar muito empolgante ter um relacionamento de verdade com 167009, um moreno magricela de andar desengonçado. Os prazeres viciantes dos Ciber-Paraísos acabaram por transformar os NERD numa casta praticamente estéril, tal o seu desinteresse pela vida “normal” na realidade física. Novos membros precisavam ser produzidos por inseminação artificial, e educados em um sistema integral que prosseguia até a sua morte. Os membros desta casta de cientistas mantinham um certo desprezo pelas outras “Raças” que compunham a Humanidade, acalentando um sentimento dissimulado de revolta muito grande, amplificado pelo tédio cada vez maior que sentiam quando não podiam estar no Outro Mundo. O que tornava impossível uma hipotética rebelião NERD era que estes sabiam — num nível quase inconsciente — que não seriam capazes de viver sem as outras castas.

A Humanidade no ano 2222 era como uma máquina de proporções galáticas. Para mantê-la funcionando era preciso manter os indivíduos divididos em Raças cada vez mais especializadas, tão diferentes entre si que já não tinham nenhum sentido de unidade. Eram como várias espécies vivendo numa simbiose extrema, que ao mesmo tempo definia suas vidas e fazia de todos prisioneiros.

Assim que o problema no campo de força da nave foi resolvido, os dois cosmotecnólogos despediram-se com poucas palavras.

Ajax Baltimor mais uma vez estaria de volta, assim como suas amantes insaciáveis.

Em NERDLAND tudo era possível.

AS AMANTES DE AJAX BALTIMOR
Texto: Simoes Lopes

 
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