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terça-feira, 1 de abril de 2008

7. AS AMANTES DE AJAX BALTIMOR

As ondas de choque indicavam que Ajax Baltimor estava rompendo a barreira do som. O estrondo não o impediu de acelerar ainda mais, tornando o vento que fustigava seus cabelos um verdadeiro tufão. Assim que avistou o sítio onde morava, nas cercanias da Cidade Gamma III, reduziu a velocidade para garantir um pouso seguro. O sol brilhava forte, e ele acenou para as lindas mulheres que aguardavam por ele na piscina, nuas e exuberantes. Livrando-se rapidamente de suas roupas, ele flexionou suas musculosas pernas e mergulhou como um verdadeiro atleta. Melynda, uma loira de enormes seios e lábios cheios esperava por ele junto a Saskah, uma bubastisiana de cabelos azuis e pele escura. Ele puxou-as para junto de si com um único movimento, e uma delas lambendo sua tatuagem de carpas douradas no bíceps esquerdo. Suas outras amantes, Glessia, Ysha e Rind, vieram juntar-se ao grupo e...

Ajax pensou que seus tímpanos iam estourar quando o zumbido metálico do alarme reverberou dentro da sua cabeça. Fechou os olhos enquanto esperava passar a dor incômoda nos ouvidos.

Quando abriu os olhos mais uma vez, ele sabia que não podia mais ser Ajax Baltimor, mas sim 167009, um cosmotecnólogo do Setor 18 do Departamento de Fotocomputrônica Astronáutica. Não tinha mais músculos, não era capaz de voar e... o mais importante... não tinha mais um harém de amantes ninfomaníacas.

A manutenção da avançada tecnologia terráquea estava a cargo da Raça conhecida como NERD. Dedicados integralmente às tarefas que definiam suas vidas, esta classe estava tão “imersa” no mundo da Ciência e Tecnologia que não podia levar uma vida normal. Eram como abelhas operárias presas em um mundo à parte. Tudo aquilo do qual eram privados era compensado pelas fantasias vividas no universo virtual chamado NERDLAND, onde 167009 podia ser quem ele quisesse, sem limites ou censuras. O princípio dos Paraísos Ciberespaciais baseava-se em tecnologias já bem antigas, remontando à rudimentar tecnologia virtual de quase trezentos anos atrás, cuja popularidade oscilava em ciclos que alternavam altos e baixos. A partir do início do Século XXIII seu uso como uma espécie de droga escapista tornou-se mais uma vez tão disseminado que não havia mais nenhum NERD fora deles. A sua vida “física” era tão desinteressante do ponto de vista afetivo que nada podia competir com os delírios hedonistas de NERDLAND.

O cosmotecnólogo 167009 — todos os de sua categoria eram conhecidos apenas por números — desconectou-se hesitantemente de suas pontes ciberespaciais para retornar ao trabalho. Os Computadores Deltafotônicos que controlavam o sistema de holoblindagem do Cruzador Espacial Tokyo trabalhavam ininterruptamente e qualquer falha por menor que fosse deveria ser imediatamente corrigida. Um sistema complexo de controle automatizado garantia que a maior parte dos problemas fosse corrigida com rapidez, mas nos raros momentos em que não bastava, era necessária a ação rápida dos cosmotecnólogos. Assim que chegou, 167009 sondou com sua colega 187721 a configuração do sistema e puseram-se juntos a analisar o relatório de erros.

Nada grave.

Apesar do trabalho estafante, os NERD devotavam uma dedicação sacerdotal às suas tarefas cotidianas. Falar de fótons, pósitrons ou quarks era como um alimento revigorante para suas mentes hiperativas. Em poucos minutos, o sistema fototrônico estava corrigido e funcionando em carga máxima, graças aos esforços combinados dos dois companheiros. A cosmotecnóloga 187721 era a melhor amiga de 167009, e este até desconfiava que os sentimentos dela por ele ultrapassavam a simples amizade. Mas nenhuma garota NERD podia competir com as mulheres virtuais de NERDLAND, e a jovem cientista atarracada de cabelos vermelhos com certeza sabia disso, até porque ela também era uma assídua freqüentadora da Outro Mundo, como também era conhecido o Ciberespaço. Fosse qual fosse sua fantasia, ela também não deveria achar muito empolgante ter um relacionamento de verdade com 167009, um moreno magricela de andar desengonçado. Os prazeres viciantes dos Ciber-Paraísos acabaram por transformar os NERD numa casta praticamente estéril, tal o seu desinteresse pela vida “normal” na realidade física. Novos membros precisavam ser produzidos por inseminação artificial, e educados em um sistema integral que prosseguia até a sua morte. Os membros desta casta de cientistas mantinham um certo desprezo pelas outras “Raças” que compunham a Humanidade, acalentando um sentimento dissimulado de revolta muito grande, amplificado pelo tédio cada vez maior que sentiam quando não podiam estar no Outro Mundo. O que tornava impossível uma hipotética rebelião NERD era que estes sabiam — num nível quase inconsciente — que não seriam capazes de viver sem as outras castas.

A Humanidade no ano 2222 era como uma máquina de proporções galáticas. Para mantê-la funcionando era preciso manter os indivíduos divididos em Raças cada vez mais especializadas, tão diferentes entre si que já não tinham nenhum sentido de unidade. Eram como várias espécies vivendo numa simbiose extrema, que ao mesmo tempo definia suas vidas e fazia de todos prisioneiros.

Assim que o problema no campo de força da nave foi resolvido, os dois cosmotecnólogos despediram-se com poucas palavras.

Ajax Baltimor mais uma vez estaria de volta, assim como suas amantes insaciáveis.

Em NERDLAND tudo era possível.

AS AMANTES DE AJAX BALTIMOR
Texto: Simoes Lopes

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