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terça-feira, 25 de março de 2008

5. FUMAÇA COLORIDA

Glo Khan e Thúr Vizi chegaram bem na hora marcada. A pequena nave ovóide deles pousou no imenso espaçoporto de Glumak Tai. Ao longe era possível apreciar a magnífica visão da Cordilheira Verde com o Monte Glumak, o pico mais alto do planeta Glenor.

A delegação de embaixadores glenorianos estava ansiosa pelo contato. O líder consensual do grupo, Baro K’Nadikon, adiantou-se a seus pares, e caminhou com pressa na direção do casal de gurzinianos.

— Vocês são bem vindos em Glenor, representantes de Gurzin! Nós vos saudamos com grande alegria! — entoou Baro a saudação de praxe.

Os outros embaixadores glenorianos conversaram bastante entre si antes de se aproximarem do par de visitantes alienígenas.

Glo Khan coçou as escamas douradas em sua cabeça redonda, e fez a saudação de praxe aos embaixadores de Glenor. Thúr Vizi piscou os grandes olhos esverdeados com pupilas verticais — incomodada com o ar relativamente frio de Glenor — e juntou-se a seu parceiro no cumprimento.

— A situação em nosso setor estelar está muito tensa. O Mercado Pan-Solar está realizando operações em N’umya, e acusa os Aldhoritas de conspirarem contra a paz e fomentarem rebeldia entre os n’umyanos — Glo Khan apressou-se em iniciar o diálogo, preocupado que estava com a situação.

O Embaixador Baro fumava cinco palitos de teb. Estes palitos eram muito populares em Glenor, feitos de uma mistura colorida de resinas aromáticas com a cera extraída de um pequeno invertebrado marinho. Do alto de seus cento e três anos de idade, Baro via a Política Galática como uma infindável teia de mentiras embelezadas por um jargão pomposo. Sabia que os Humanos jamais deixavam de usar a força quando lhes convinha, e que a União Planetária não conseguiria conter os impulsos beligerantes por muito tempo.

O cheiro forte e doce do teb parecia incomodar um pouco o interlocutor de Gurzin, que começou a espirrar, fazendo seus longos apêndices carnudos em forma de bigodes balançar.

— Já fomos informados que uma delegação de aldhoritas renegados foi presa ao pousar em seu planeta natal — informou Baro, com uma expressão que corretamente analisada seria percebida como melancólico. Os Gurzinianos ficaram assustados.

— Estamos aqui em nome de Gurzin declarar nosso apoio incondicional à União Planetária, e solicitar o envio de uma frota de couraçados em nosso apoio. O patrulhamento de nossas colônias está insuficiente para impedir incursões dissimuladas das espaçonaves terranas.

Baro K’Nadikon deu uma tragada tão forte que um dos palitos de teb simplesmente desmanchou-se num clarão de luz colorida. Sabia que os Gurzinianos estavam com medo da presença das belonaves do Mercado Pan-Solar em sua região galática, e tinha convicção de que seria uma questão de tempo mais esse planeta deixar a União Planetária e aderir à Esfera Neutra. A detecção dos Aldhoritas em N’umya havia provocado um verdadeiro turbilhão nos círculos diplomáticos da União. A alegação dos terráqueos era que ao participar de operações clandestinas, Aldhor estava oficialmente retirando-se da Esfera Neutra para aproximar-se da União. No jargão da poderosa Agência de Risco da Terra, os aldhoritas haviam sido rebaixados da categoria WILD, isto é, “selvagem”, dos mundos considerados neutros, para a classe odiada dos VOID, “os vazios”, devendo ser considerados como aliados dissimulados da União Planetária.

Os Humanos deslocaram dois de seus mais modernos couraçados, Peace e Freedom, para as cercanias do sistema planetário de Aldhor, e exigiram a prisão dos “dissidentes”. Sem opção melhor à vista, o governo aldhorita prontamente atendeu as exigências do Mercado Pan-Solar, e os supostos espiões estão presos e incomunicáveis. Mas os terráqueos não se deram por satisfeitos e agora pediram que lhes fossem entregues os cativos.

A União Planetária reiterou pelos canais cabíveis que não tinha nenhum vínculo com Aldhor, e que não estava em seus planos nenhuma ação de confronto. Os embaixadores glenorianos foram escolhidos para conduzir as negociações por serem os mais antigos, e acumularem uma vasta experiência no contato com os humanos. Pelas leis de Glenor, quanto mais velho, mais qualificado era um diplomata, o cargo era vitalício e sem direito a aposentadoria. Em outras palavras, os diplomatas glenorianos dedicavam-se a negociar até morrer. Baro K’Nadikon e sua falecida mãe Jud’ru K’Nadikon, estiveram entre os principais artífices do Tratado de Torka, que definiu os limites entre as esferas de influência dos Planetas Humanos e a União Planetária, garantindo um cinturão de “amortecimento” formado por planetas neutros. Para isso funcionar, a União teve que renunciar às suas posturas pacifistas seculares e reativar sua tecnologia bélica. Só assim foi possível refrear o ímpeto expansionista dos terráqueos, que planejavam esmagar até mesmo os planetas mais antigos da União. Além disso, a União nada pôde fazer para impedir que os mundos já conquistados fossem libertos: a Terra manteve suas possessões de forma integral.

As últimas ações da União haviam sido tomadas às pressas para impedir mais um conflito. A Terra alegava — como sempre — que estava apenas defendendo-se de ameaças externas, e que tinha direito a zelar pela neutralidade dos planetas assim declarados. As diversas espécies alienígenas que compunham a União, que mal passavam do cinqüenta — número irrisório considerando-se as mais de 3.000 que fizeram parte dela nos séculos anteriores à expansão da Humanidade, estavam enviando seus representantes diplomáticos para Glumak Tai, a maior cidade do planeta Glenor, para votarem numa nova deliberação coletiva. Tais assembléias eram normalmente feitas por meio de hipercomunicação, mas o medo de interceptações e espionagem tornaram necessária a volta das grandes reuniões de corpo presente. Uma vez protegidos, os embaixadores poderiam expressar suas opiniões de maneira mais direta. A maioria das delegações chegara com o mesmo pedido: reforçar o contingente militar em seus setores, algo que estava ficando cada vez mais difícil para as sobrecarregadas frotas da União.

À medida que escoltava a delegação gurziniana para os monotrilhos da estação de transporte, Baro olhava para os círculos de fumaça que dançavam ao redor de sua cabeça, formando anéis, ora vermelhos, ora azuis, até acabarem finalmente dispersados pelas rajadas possantes do Vento Oeste que zunia pelo espaçoporto. Assim ele percebia as ações da União: meras nuvens passageiras de fumaça a rodopiar e dançar, funcionando como distração por breves instantes, mas incapazes de resistir à fúria da ventania.

Os ventos sopravam cada vez com mais força.

Ventos que vinham do Planeta Terra.


FUMAÇA COLORIDA
Texto: Simoes Lopes

2 comentários:

Leonardo T. disse...

isso ai! Tomara que os terranos não consigam avançar e que alguma outra raça lhes mostre o caminho certo! mal posso esperar o que este ventos trazem!!!

Parabéns pelos textos!

Anônimo disse...

"A Terra alegava — como sempre — que estava apenas defendendo-se de ameaças externas"

cara, isso é tipicamente comportamento humano... até parece coisa do Bush e seu EUA...

parabéns, ainda falta ler os recentes...

 
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